Amma e Yurugu: caos e equilíbrio na história Dogon

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Introdução Por que o mundo é como é? Por que a ordem e o caos parecem caminhar lado a lado desde sempre?  Para o povo Dogon , do Mali , essas perguntas não são meras abstrações filosóficas — elas são respondidas por uma história ancestral que atravessa gerações.  No centro dessa narrativa estão duas figuras fundamentais: Amma , o princípio criador, e Yurugu (também chamado de Ogo ), a entidade da incompletude e da desordem.  Longe de serem apenas personagens simbólicos, eles representam forças reais e atuantes na construção e no funcionamento do universo.  A tradição Dogon não apresenta uma visão maniqueísta do mundo.  Em vez disso, oferece uma leitura complexa, onde o desequilíbrio não é um erro, mas uma parte inevitável do processo cósmico.  Este artigo mergulha na história de Amma e Yurugu , explorando suas ações, consequências e o que elas revelam sobre a visão Dogon da existência. Segundo os Dogon , Yurugu vagaria eternamente pelo cosmos em busca...

Susanoo e Yamata no Orochi: o Confronto Lendário

Introdução


Entre os registros mais antigos da tradição japonesa, o nome de Susanoo-no-Mikoto se destaca como o de uma divindade intensa, errante e decisiva. 

Filho de Izanagi, irmão de Amaterasu e Tsukuyomi, Susanoo é apresentado nos textos do Kojiki (712 d.C.) e do Nihon Shoki (720 d.C.) como uma figura que transita entre o céu e a terra, entre o caos e a ordem. 

Seu nome está diretamente ligado a um dos episódios mais marcantes da mitologia japonesa: o confronto com a criatura conhecida como Yamata no Orochi, um dragão de oito cabeças e oito caudas que aterrorizava a província de Izumo.

Esse episódio não é tratado como alegoria ou metáfora nos registros antigos. 

Ele é apresentado como um acontecimento concreto, testemunhado e transmitido por gerações. 

A narrativa descreve com precisão os eventos, os diálogos, os preparativos e as consequências da batalha entre Susanoo e a criatura

Ao longo do relato, surgem elementos que permanecem centrais na cultura japonesa até hoje, como a origem da espada Kusanagi — um dos Três Tesouros Sagrados do Japão — e a importância da província de Izumo como território sagrado.

Neste artigo, vamos acompanhar os registros dessa história tal como foram preservados: sem interpretações simbólicas, sem adaptações modernas. 

Apenas o relato, como foi contado. 

Vamos seguir os passos de Susanoo desde sua expulsão do céu até sua vitória sobre o dragão, passando pelo encontro com a jovem Kushinada-hime e a descoberta da lendária espada. 

Uma história de coragem, estratégia e transformação — contada como foi registrada.


Susanoo diante do dragão Yamata no Orochi
Ilustração de Susanoo encarando o dragão Orochi. Curiosidade: segundo relatos antigos, o monstro tinha oito cabeças e oito caudas, cada uma representando forças caóticas da natureza.



A expulsão de Susanoo e sua chegada à terra


Nos registros do Kojiki, Susanoo é descrito como uma divindade tempestuosa, associada aos mares e às tormentas. 

Após uma série de comportamentos considerados inaceitáveis no plano celestial — incluindo a destruição de campos de arroz e a profanação de espaços sagrados — ele é expulso do Takamagahara, o plano dos deuses. 

Sua irmã Amaterasu, a deusa do sol, rompe com ele após um episódio de confronto direto, e Susanoo é enviado à terra.

Ao descer, Susanoo chega à região de Izumo, onde encontra um casal idoso, Ashinazuchi e Tenazuchi, em profundo desespero. 

Eles explicam que uma criatura monstruosa chamada Yamata no Orochi devorou sete de suas oito filhas, e que agora a última, Kushinada-hime, está prestes a ser levada. 

O relato é direto, sem floreios: a criatura aparece uma vez por ano e exige uma filha como sacrifício.

Susanoo, ao ouvir a história, propõe um acordo. 

Ele promete derrotar a criatura em troca da mão de Kushinada-hime. 

O casal aceita, e Susanoo começa a preparar sua estratégia

Antes disso, transforma a jovem em um pente sagrado, que ele prende em seus cabelos para protegê-la durante o combate.


A descrição do Yamata no Orochi


O dragão Yamata no Orochi é descrito com riqueza de detalhes nos registros antigos. 

Seu corpo se estendia por oito vales e oito montanhas, e possuía oito cabeças e oito caudas. 

Os olhos eram vermelhos como frutas maduras, e sua pele estava coberta de musgo, cipós e sangue. 

A criatura era tão imensa que seu corpo ocupava toda a paisagem, e sua presença era acompanhada por um cheiro forte e um som de respiração pesada que fazia a terra tremer.

Esse tipo de descrição não aparece como metáfora nos textos antigos

É apresentada como relato direto, com detalhes que indicam observação e transmissão oral precisa. 

O dragão representava uma ameaça real à comunidade local, e sua presença era cíclica e devastadora. 

A cada ano, ele retornava para devorar uma das filhas do casal, e ninguém havia conseguido detê-lo até então.

A imagem do Orochi não é apenas a de uma fera irracional. 

Ele é descrito como astuto, resistente e perigoso

Sua força não estava apenas no tamanho, mas na capacidade de resistir a ataques e de se mover com velocidade surpreendente, mesmo com seu corpo colossal

Isso exigia de Susanoo não apenas força, mas inteligência e preparo.


O plano de Susanoo para derrotar o dragão


Susanoo sabia que não poderia enfrentar o Orochi diretamente. 

Por isso, elaborou um plano cuidadoso. 

Ele pediu ao casal que preparasse oito plataformas, cada uma com um barril de sakê fortíssimo, conhecido como yashiori no sake

Esse tipo de bebida era preparado com um processo especial de fermentação, e sua potência era suficiente para embriagar até mesmo uma criatura divina.

As plataformas foram posicionadas diante de oito portões, cada um voltado para uma das cabeças do dragão. 

Quando Yamata no Orochi apareceu, atraído pelo aroma do sakê, ele mergulhou cada uma de suas cabeças em um barril e começou a beber. 

Embriagado, o dragão adormeceu com cada cabeça diante de um dos barris.

Nesse momento, Susanoo atacou. 

Com sua espada celestial, ele cortou cada uma das cabeças, uma por uma. 

A batalha foi longa e sangrenta, e o corpo do dragão se contorcia violentamente. 

Mesmo embriagado, o Orochi ainda ofereceu resistência. 

Mas Susanoo manteve a estratégia e, com precisão, derrotou a criatura por completo.


A descoberta da espada Kusanagi


Após a vitória, Susanoo começou a cortar as caudas do dragão. 

Ao atingir a quarta cauda, sua espada encontrou algo duro. 

Dentro da cauda, ele descobriu uma lâmina de brilho incomum. 

Era uma espada de aparência divina, que não havia sido forjada por mãos humanas. Susanoo a retirou e reconheceu seu valor.

Essa espada foi chamada de Ame-no-Murakumo-no-Tsurugi, e mais tarde ficou conhecida como Kusanagi-no-Tsurugi

Susanoo a ofereceu como presente de reconciliação à sua irmã Amaterasu, selando a paz entre os dois. 

A espada passou a ser guardada como um dos Três Tesouros Sagrados do Japão, ao lado do espelho Yata-no-Kagami e da joia Yasakani-no-Magatama.

A origem da espada está registrada como parte do relato da batalha, e não como invenção posterior. 

Ela é mencionada nos textos como descoberta concreta, ligada diretamente ao corpo do dragão derrotado. 

Até hoje, a Kusanagi é considerada símbolo de autoridade imperial, e sua presença é reverenciada em cerimônias de entronização.


Susanoo encontra a Espada Kusanagi na cauda de Orochi
Momento em que Susanoo retira a lendária Espada Kusanagi de dentro da cauda de Orochi. Curiosidade: Kusanagi se tornou um dos Três Tesouros Sagrados do Japão.



Reflexão Final


O confronto entre Susanoo e Yamata no Orochi permanece como um dos episódios mais marcantes da mitologia japonesa. 

Não apenas pela ação heroica, mas pela forma como os registros preservaram os detalhes: nomes, locais, objetos, estratégias. 

A história é contada como fato, transmitido por quem viu ou ouviu, e mantido vivo por séculos.

A espada Kusanagi, surgida da cauda do dragão, ainda hoje é reverenciada como símbolo de autoridade imperial

A província de Izumo, cenário da batalha, é considerada território sagrado. 

E Susanoo, antes visto como desordeiro, passa a ser lembrado como restaurador da ordem.

Esse relato mostra como os registros antigos preservam não apenas eventos, mas também a memória de quem os viveu. 

Ao contar essas histórias como foram escritas, sem metáforas ou interpretações, mantemos viva a voz de quem testemunhou — e seguimos caminhando, do homem... ao divino.

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